Como preparar seu pet para exames

MV Giovana F. Esmanhoto Arazaki
7 min readFeb 21, 2022

A verdade é: nós veterinários não podemos contar com a colaboração dos nossos pacientes para fazer exames.

Cães não ficam quietinhos durante os procedimentos como as pessoas. Não adianta falar para sentar, respirar fundo e esticar o bracinho ou fazer xixi no copinho a tal horário.

Foto: AmahVet

A maioria dos pacientes tem medo de ir ao hospital (porque geralmente vão lá quando estão doentes ou com dor e, com isso, recebem agulhadas aqui e ali) e se assustam com um jaleco branco e a manipulação. Só esse estresse da coleta já é mais que suficiente pra levantar a glicemia e provocar alterações nas células de defesa.

Fazer exames na medicina veterinária é um desafio. Mas uma coisa está no nosso controle: preparar o pet adequadamente para fazer exames! Só de fazer isso certinho, já é meio caminho andado para ter resultados de exames confiáveis.

A prática de fazer exames em animais exige muito cuidado, tanto por parte dos veterinários quanto dos tutores, a fim de garantir que as amostras apresentem o melhor resultado durante as análises.

São coisas simples, mas que se feitas da maneira errada, podem atrapalhar o diagnóstico da doença do seu cãozinho. Por exemplo, um jejum muito curto ou muito longo antes de uma coleta de sangue, faz com que os resultados dos exames sofram alterações, trazendo valores que não são reais!

Para te ajudar com isso, eu que sou veterinária e me deparo frequentemente com exames que sofreram alterações por falta de um preparo adequado, preparei um guia de como preparar seu pet da forma correta para realizar exames: o que pode ou não pode, como fazer o preparo e qual o tempo certo de enviar a amostras para o laboratório!

Vamos lá?

Exame de sangue

A primeira dica é que antes do exame você converse com o veterinário clínico para saber quantas horas de jejum o animal precisa fazer. Isto porque o tempo não é igual para todos os exames, o que pode alterar no resultado.

Geralmente, os veterinários solicitam um jejum de sólidos entre oito e doze horas, dependendo do exame. Deixar o paciente em jejum por mais tempo que isso, como quinze ou dezesseis horas, “para garantir”, pode trazer sérias alterações nos parâmetros bioquímicos.

Outra coisa importante é que o jejum sólido é absoluto. Ou seja, durante o período, não se pode dar um lanchinho, uma frutinha ou deixar que o cãozinho roube comida de outro animal, já que isso também traz alteração no exame. Isto porque, depois que come, ele absorvendo os nutrientes, o que aumenta o teor de gordura no sangue (lipemia).

Isso é normal e fisiológico, mas se estamos fazendo um exame, a lipemia pode atrapalhar a leitura do laboratório, porque a máquina lê os exames através de feixes de luz, e se o sangue estiver espesso e gorduroso, isso interfere nos resultados.

E aí o que acontece? Precisa coletar de novo! Outra viagem ao vet, outra picadinha e outro estresse — que poderiam ser evitados.

Também é importante salientar que não se faz jejum de água. A desidratação pode alterar os resultados dos exames. O paciente precisa estar hidratado para a coleta, para que o sangue seja coletado com mais facilidade, o que ajuda na hora de diluir a amostra para realizar os exames no laboratório.

Exame de ultrassom

Assim como no exame de sangue, também é importante que o cachorro esteja em jejum na hora de realizar o ultrassom. Isto porque a comida no estômago faz uma espécie de “sombra” na imagem e atrapalha a visualização de outros órgãos.

Em geral, a recomendação é de quatro horas de jejum para cães pequenos e oito horas para cachorros de grande porte. É importante que o tutor sempre fale, antes da ultrassonografia, se o animal realmente está sem comer e a quanto tempo. Por exemplo, se o paciente está há oito horas em jejum, mas ainda tem comida no estômago, isso significa que há um retardo no esvaziamento gástrico, o que merece atenção e manejo adequado. É importante que essa informação (se o paciente está em jejum ou não), esteja no laudo médico.

Além disso, sempre leve exames anteriores para o médico veterinário ultrassonografista que vai realizar o exame. Isso auxilia na hora da avaliação para saber se há alguma melhora naquela situação que se está acompanhando.

Exame de urina

Este também é um exame simples, mas que é necessário ter muita atenção, principalmente porque há diferentes maneiras de coleta.

A primeira delas é a coleta por micção espontânea, aquela com o copinho. É a forma menos invasiva e pode ser feita até em casa, pelo tutor mesmo. Se optar por coletar em casa, primeiro de tudo, peça ao veterinário ou ao laboratório o copinho ou compre em uma farmácia humana.

Para coletar a urina, basta colocar o recipiente embaixo do cãozinho na hora que ele vai fazer o xixi (mais fácil fazer isso com os machinhos, que levantam a perninha). Uma outra alternativa, caso você não consiga dessa forma, é fazer com que o animal urine em um pratinho limpo e, depois, coletar o xixi com uma seringa, colocando o conteúdo em um recipiente apropriado e o levando ao laboratório.

Agora, quando a coleta ocorre por meio da micção espontânea são grandes as chances de aparecimento de bactérias na urina. Isto porque, quando a urina sai do corpo do animal, ela entra em contato com a pele ou pelos, o que faz com que ela se contamine com as bactérias, naturalmente, que estão ali.

Por isso, se a coleta da urina tem o objetivo de investigar uma infecção urinária, fazendo a cultura da urina para ver se cresce alguma bactéria e quem sabe entrar com um antibiótico para tratar, aí não podemos coletar dessa forma. Nesse caso, a amostra não pode sofrer nenhum tipo de contaminação.

Se é esse o objetivo, a coleta ideal é por meio da cistocentese. Nesse caso, a urina é coletada diretamente da bexiga, com seringa e agulha. Esse tipo de coleta é feita somente por um médico veterinário, com o auxílio do ultrassom, para acompanhar a entrada da agulha e a coleta da urina.

Mas por que essa diferença?

Deixa que eu te explico: é natural ter bactéria nas mucosas vaginal/peniana do lado de fora. Lá dentro da bexiga, não é pra ter nenhuma bactéria morando e, por isso, espera-se que não venha nada junto. Então, se ela aparecer no resultado, significa que o animal está com uma infecção.

Logo, o método de coleta da urina é uma informação importante que deve ser repassada ao laboratório na hora de entregar a amostra, porque, se for pelo copinho, o veterinário vai entender que ela apareceu devido ao tipo de coleta, já se for por cistocentese, ele chegará na conclusão que há uma infecção na bexiga do animal.

A cistocentese também é o método de coleta de urina mais indicado quando se quer analisar a relação da proteína creatinina urinária (UPC), já que a presença de bactérias na urina pode alterar esse parâmetro.

Em quanto tempo a urina deve ser analisada?

Outro ponto importante, que se deve ter cuidado, é o momento ideal de encaminhar a coleta para análise, já que se ela ficar muito tempo dentro do potinho, ela pode sofrer alterações.

Isso acontece porque, dentro do potinho, as bactérias continuam o metabolismo delas normalmente, o que altera o pH da urina, a deixando mais alcalina. Ao alterar o pH urinário, outro parâmetro sofre alteração: os cristais. São indicadores muito importantes que mostram uma tendência daquele paciente a formar cálculos nos rins e bexiga. E dependendo do pH do ambiente esses cristais podem sumir ou aparecer na amostra! Olha só que informação importantíssima para um diagnóstico correto!

A temperatura também influencia no aparecimento dos cristais, então nada de colocar a amostra de urina na geladeira para levar para o laboratório mais tarde!

Por isso o certo é: coletou a urina, leve imediatamente ao laboratório ou o local onde a análise será realizada. A amostra deve ser analisada idealmente em 2 ou no máximo em 4 horas.

Outra dica é importante: após a coleta, coloque um papel alumínio ao redor do potinho. Isto porque a luz também interfere na amostra.

Tem um melhor horário para coletar a urina?

Por fim, o ideal é que a coleta da urina ocorra durante a manhã, já que a chance de concentração é maior. Se isso não for possível, deixe o cão pelo menos três a quatro horas sem urinar, antes da coleta. A bexiga vazia faz com que o xixi tenha uma densidade baixa, o que também atrapalha na hora do exame e pode até impossibilitar uma coleta por cistocentese se tiver pouca urina dentro da bexiga.

Exame de fezes

Existe mais de um exame de fezes, então vamos dar nomes aos bois! O exame coproparasitológico é realizado para pesquisar possíveis parasitas intestinais. Já o exame coprológico funcional avalia a digestão.

No caso do exame coproparasitológico, o ideal é fazer 3 coletas seguidas, em três dias diferentes e alternados. Por exemplo, a coleta pode ocorrer na segunda, quarta e sexta, ou segunda, quinta e segunda da outra semana.

Seguir esse caminho é importante porque os parasitas se reproduzem em ciclos. Ou seja, por mais que se tenha uma infecção, não é todo dia que as fezes vão sair com os ovos e, consequentemente, existe a chance de o paciente ter um parasita e naquele dia não expelir nenhum ovo/cisto. Então, para ter certeza, o ideal é coletar em um período maior e intercalado.

Para esse exame, não precisa levar as fezes inteiras, um pedaço do material já é suficiente. A amostra de fezes é considerada viável pra análise apenas por 12 horas. Se você não puder levar imediatamente ao laboratório, deixe na geladeira em recipiente vedado. Isso ajuda a diminuir a atividade dos parasitas e os mantém ali por mais tempo até que seja possível levar o exame.

Agora, se for um exame coprológico funcional, que tem como objetivo ver se o animal está digerindo a comida ou mesmo a função do pâncreas, a amostra deve ser levada inteira dentro de um potinho. As fezes também precisam ser frescas. O ideal é que elas sejam analisadas em até 30 minutos.

Assim como para o exame de urina, após a coleta, coloque um papel alumínio ao redor do potinho para impedir que a luz altere a amostra.

Ufa, são muitas dicas, não é?

Mas se você seguir elas direitinho, melhor será o resultado do exame do seu cachorro e, assim, você garante o melhor bem-estar a ele!

MV Giovana F. Esmanhoto Arazaki
CRMV 15.170

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MV Giovana F. Esmanhoto Arazaki

Médica veterinária com foco em Nutrologia de Cães e Gatos e Dietética Chinesa. Apaixonada por bichos, viagens e estar com quem amo :)